Educar para Inovar: O papel do Paciente nas Novas Tecnologias em Saúde
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Educar para Inovar: O papel do Paciente nas Novas Tecnologias em Saúde
Quando falamos em inovação em saúde, muitas vezes pensamos em avanços científicos, novos medicamentos ou tecnologias revolucionárias. Mas existe um elemento essencial para que tudo isso faça sentido: o paciente.
A centralidade do paciente nas políticas e práticas de saúde é um princípio amplamente defendido, mas ainda distante da realidade. Em webinar recente, o sanitarista, advogado e ativista em políticas públicas de saúde Tiago Farina Matos analisou os principais desafios e caminhos para fortalecer o papel do paciente na incorporação de novas tecnologias no Brasil.
O paradoxo da centralidade do paciente
Apesar do discurso consolidado sobre colocar o paciente no centro das decisões, Tiago destaca que a prática é marcada por contradições. Cada ator do sistema de saúde – hospitais, médicos, operadoras, indústria, governo e até as famílias – age com boas intenções, mas limitado por seus próprios interesses e restrições.
Esse cenário cria um paradoxo: todos acreditam estar priorizando o paciente, mas ele raramente é o elemento principal nas decisões. A ausência de uma agenda comum e o predomínio de conflitos de interesse dificultam avanços consistentes.
Educação como base para engajamento efetivo
O conceito de empoderamento do paciente, ainda que por vezes contestado, é fundamental para transformar informação em engajamento. Segundo Tiago, a baixa mobilização social em torno de questões críticas de saúde evidencia tanto um déficit educacional quanto um traço cultural.
Enquanto a sociedade brasileira reage prontamente a causas coletivas visíveis, mostra dificuldade em lutar por direitos individuais, especialmente no campo da saúde. Daí a importância de uma educação cidadã e sanitária, que ensine desde cedo o funcionamento dos processos públicos e o papel de cada cidadão na cobrança de resultados.
Associações de pacientes: entre o assistencialismo e o Advocacy
As organizações de pacientes ocupam um papel estratégico, mas frequentemente restrito. Muitas vezes, sua participação em conselhos ou consultas públicas é meramente simbólica, sem condições reais de cocriar soluções.
Para que avancem de ‘consultadas’ a ‘protagonistas’, Tiago aponta três condições essenciais:
Domínio das ferramentas de Advocacy, incluindo instrumentos jurídicos, consultas públicas e projetos de lei.
Postura crítica em relação aos espaços de participação, evitando legitimar processos ineficazes.
Capacitação para negociar em igualdade, superando o histórico assistencialista e o efeito da “síndrome de vira-lata” que limita a percepção do próprio poder.
Consulta pública: potencial subaproveitado
Na avaliação de tecnologias em saúde, a consulta pública é considerada o principal espaço de participação social. Contudo, sua efetividade permanece reduzida.
Segundo Tiago, a limitação está tanto na baixa clareza sobre o que se espera do paciente quanto na incapacidade dos gestores de absorver e utilizar as contribuições. O resultado é um processo de alta mobilização, mas impacto marginal.
A recomendação é clara: capacitar os pacientes a contribuírem nos pontos efetivamente críticos (como viabilidade financeira e logística) e preparar os gestores para capturar a inteligência coletiva oferecida pela sociedade.
Mensuração do Advocacy: da prática à metodologia
Um dos desafios recorrentes das organizações é medir a efetividade de suas ações de Advocacy. Tiago sugere o uso de diários de bordo, que registrem sistematicamente todas as iniciativas (contatos, reuniões, e-mails, resultados parciais).
Esse modelo, inspirado em metodologias ágeis como o Scrum, permite monitorar avanços processuais, aprender com erros e avaliar com mais precisão a correlação entre ações e resultados.
Transparência como condição para mudança sistêmica
Ao ser questionado sobre a única medida que poderia gerar maior impacto imediato no protagonismo do paciente, Tiago foi categórico:
“Se eu pudesse mudar apenas uma coisa, tornaria todos os processos administrativos transparentes. Acesso radical à informação é a chave para que a sociedade exerça de fato seu poder.”
A transparência plena permitiria à sociedade acompanhar em tempo real as etapas decisórias, contribuir com maior qualidade e exercer a responsabilização dos gestores públicos de forma mais efetiva.
Conclusão
O fortalecimento do protagonismo do paciente na inovação em saúde depende de três eixos centrais: educação cidadã, capacitação das associações e transparência institucional. Avançar nesses pilares é condição indispensável para que a inovação tecnológica cumpra seu propósito maior: gerar benefícios concretos, equitativos e sustentáveis para a população.
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